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Já
estamos em plena campanha eleitoral, com praticamente toda a mídia batendo
forte no governo Dilma. Os focos são dois: uma economia que “vai mal” e a
“incapacidade do governo” de enfrentar as crises de governabilidade geradas
pelas mobilizações e protestos sociais, e pela violência que penetra o
cotidiano e desborda o controle do Estado.
A economia “vai mal” depois que o governo Dilma tomou iniciativas como reduzir a taxa Selic, enfrentar a usura dos bancos privados reduzindo as taxas de juros dos bancos públicos e ser contra o aumento real de tarifas de serviços públicos privatizados. Mesmo com uma ampla política de isenções tributárias para a defesa da indústria, o risco de o governo não cumprir a meta do “superávit primário”, isto é, a parte de arrecadação dos impostos que é destinada ao pagamento dos juros da dívida interna, o grande nó que impede o crescimento, deixou a direita em pé de guerra. Indicadores positivos como os menores índices de desemprego da história recente e o aumento do consumo não entram em consideração.
A
internacionalização de nossa economia nos últimos anos trouxe para a cena
política nacional a atuação de grandes lobbies empresariais internacionais, que
têm todo interesse em manter o câmbio com o real apreciado, favorecendo seus produtos
importados e combatendo assim a concorrência nacional. A ameaça da inflação é o
espectro que ronda esses argumentos, mesmo que não exista evidência de que um
ajuste na política cambial provoque a inflação, como aponta Amir Khair.
A
desindustrialização do país é consequência disso. As remessas de lucros das
empresas internacionais para suas matrizes colaboram para que a taxa de
investimento produtivo no país se reduza e o crescimento desacelere. Na
verdade, essa corrente de pensamento que anuncia que a economia vai mal não
pensa no país e no bem-estar dos brasileiros.
Antes, no governo Lula, o cenário da economia internacional era favorável a uma política que tanto contemplava as exigências do capital quanto permitia o aumento do emprego, o crescimento real do salário mínimo, o aumento do consumo, o incremento das políticas sociais e as transferências de renda para os mais pobres, mas essa realidade mudou. A crise internacional teve seu impacto na economia brasileira, e a balança comercial mostra isso, mas a oposição não trata do assunto. Age como se o Brasil flutuasse no nada e toda a responsabilidade sobre o desempenho da economia dependesse do governo federal. A exigência apresentada pelas manifestações de escolas “padrão Fifa” expressa a contradição do momento. Se há dinheiro para a Copa, para obras faraônicas, por que não se tem para a educação? Mas esse clamor que veio das ruas, que sensibilizou num primeiro momento o governo, agora não encontra eco entre as autoridades. As pressões empresariais são enormes e o governo vem recuando em todas as frentes: aumenta a Selic, desacelera a atuação dos bancos públicos na redução das taxas de juros e no preço dos serviços, oferece novas áreas de exploração de serviços públicos para as empresas privadas na forma de novas concessões, vai a Davos assegurar que vai priorizar os interesses do mercado. Nem mesmo o recente contingenciamento do gasto público − esse corte da ordem de R$ 44 bilhões nas despesas previstas no orçamento da União para assegurar o superávit primário − acalma os ânimos. Nada disso agora tranquiliza “o mercado”.
Mesmo
com essas concessões e garantias, a direita vê neste momento a oportunidade de
desestabilizar o governo Dilma e fragilizá-la para as próximas eleições; quer
lutar para terminar com o longo período em que se viu privada do controle da
máquina pública federal. Daí toda a ofensiva que se vê nas maiores revistas
semanais, nos grandes jornais e na TV, apontando a existência de uma violência
social descontrolada, a ameaça de uma sociedade a caminho da barbárie e do
caos, como se essas questões não estivessem ligadas à desigualdade social e à
precariedade dos serviços públicos. A receita da direita para enfrentar essa
situação seria, portanto, endurecer o controle social e a repressão, criminalizar
os movimentos sociais, ter um governo que imponha a lei e a ordem a qualquer
custo, em suma, militarizar a gestão pública.
As discussões, hoje, são muito diferentes das que se esboçaram depois das manifestações de junho, quando Dilma propôs, para atender às demandas expressas nas ruas, uma reforma política, investimentos maciços em mobilidade nas cidades e mais recursos para educação e saúde. Muita coisa parou no Congresso. Só o que teve impacto imediato foi o Programa Mais Médicos, apesar da virulenta resistência da categoria profissional.
As
bandeiras da oposição, até o momento, falam em garantir a independência e
autonomia do Banco Central em relação ao governo, abrir mais a economia para as
corporações transnacionais, privatizar mais, exportar commodities cada vez mais.
Está na hora de essa campanha eleitoral olhar para as demandas dos cidadãos brasileiros e superar o autismo com que o Congresso trata as manifestações de junho. Afinal, quais são os planos de governo que estão em disputa?
É
alentador ver que no Rio de Janeiro o candidato a governador pelo PT, o senador
Lindbergh Farias, já no ato de lançamento de sua candidatura, defendeu a
educação em tempo integral para toda a rede pública, recuperando a proposta de
Darcy Ribeiro materializada nos Cieps; a erradicação do analfabetismo em quatro
anos no estado; a volta dos pontos de cultura; a participação cidadã na
formulação das políticas e no controle da gestão pública, entre outras
propostas.
Esperamos pelos planos de governo dos candidatos.
Silvio
Caccia Bava
Diretor
e editor-chefe do Le Monde Diplomatique
Brasil
Retirado de: Le Monde |
